key: cord-0968457-vmhjypx7 authors: de Holanda, Lucianna Serfaty; Vieira, Laíses; Campos, Maria Talita; de Holanda, Vitor Bruno Teixeira; Silva, Ivy Almeida Cavalcante e; Serfaty, Daniel; Vieira, Feliciano Mendes title: Infecção por COVID-19 em Gestante Cardiopata date: 2020-11-01 journal: Arq Bras Cardiol DOI: 10.36660/abc.20200517 sha: 40dc0e72ef7ccdf91b5f8792b94f9bccd02aa96f doc_id: 968457 cord_uid: vmhjypx7 nan Sobre os aspectos obstétricos da infecção COVID-19, é necessário considerar que ela é uma doença recente, não havendo conhecimento específico acerca do assunto para a elaboração de protocolos assistenciais. Em decorrência disso, várias orientações baseiam-se na comparação com infecções causadas por outros vírus (SARS-CoV, MERS-CoV e H1N1); portanto, tudo o que existe de evidências atualmente está sujeito a modificações a partir de novas descobertas. As infecções causadas por SARS-CoV e MERS-CoV foram limitadas regionalmente, mas os poucos casos obstétricos publicados apontam a necessidade de suporte avançado de vida para as gestantes com grave comprometimento do prognóstico materno. Todos realçam a importância dos cuidados com a dispersão do vírus. [1] [2] [3] [4] Em uma revisão publicada, foram selecionados 23 estudos, somando 32 gestantes e 30 recém-nascidos. As gestantes se apresentaram assintomáticas em 22% dos casos, mas 6% necessitaram de cuidados de suporte avançado de vida em unidade de terapia intensiva (UTI). A via de parto foi a cesárea em 27 mulheres, e 47% dos partos ocorreram antes de 36 semanas de gestação. Os autores informaram que nenhum caso de morte materna foi observado nessa revisão. Além disso, outra extensa revisão apontou que até o momento não foi confirmado nenhum caso de transmissão vertical desse vírus. 5 Há relatos limitados de séries de casos sobre o impacto dos Coronavírus durante a gravidez. Nas mulheres afetadas por síndrome respiratória aguda grave (SRAG) ou síndrome respiratória do Oriente Médio (SROM), a taxa de mortalidade apareceu mais alta nas que foram afetadas durante a gestação, em comparação com as não grávidas. 6 Descrição Paciente gestante, 26 anos, G3P1A1, com antecedente de valvopatia mitral reumática com troca de valva mitral biológica há 9 anos. Histórico de internações anteriores, em 2014, para realização de parto pré-termo cesariana. Naquele momento, a paciente encontrava-se assintomática, do ponto de vista cardiovascular; por isso, não houve indicação de contracepção definitiva por parte da equipe que a avaliou. Depois disso, a paciente seguiu em acompanhamento ambulatorial na cardiologia. Em uso de Carvedilol, 3,125 mg 12/12h; AAS, 100 mg/dia; e Penicilina G benzatina, 1.200.000 UI a cada 21 dias. Em 31 de outubro de 2019, a mulher apresentou necessidade de internação hospitalar, dando entrada no serviço de prontoatendimento cardiológico devido a novo quadro gestacional de 16 semanas, evoluindo com taquicardia ventricular sustentada com frequência cardíaca de 140 batimentos por minuto (bpm), pressão arterial de 120 x 70 mmHg, sem sinais clínicos de instabilidade hemodinâmica. O resultado dos exames laboratoriais do dia da internação estava sem sinais de anemia, distúrbios da coagulação, infecção, distúrbios hidroeletrolíticos e disfunção hepática ou renal. Em ultrassonografia (USG) obstétrica de feto único, não havia sinais de sofrimento fetal. Após compensação da arritmia e do quadro clínico, a gestante permaneceu internada, foi acompanhada pela equipe de obstetrícia e avaliada pela cardiologia. Ela realizou um ecocardiograma que evidenciou átrio esquerdo de tamanho aumentado (50 mm), fração de ejeção de 64%, área valvar da prótese de 1,0 cm 2 , gradiente ventrículo esquerdo-átrio esquerdo (VE-AE) 12 e pressão sistólica de artéria pulmonar 40. A paciente recebeu alta médica no dia 5 de novembro de 2019, com orientação de seguimento em ambulatório de pré-natal de alto risco do serviço. Não obstante, no dia 9 de março de 2020, ela deu entrada na emergência do serviço, apresentando quadro de taquicardia com frequência de 200 bpm e dor em baixoventre. O eletrocardiograma evidenciou taquicardia paroxística supraventricular. Naquela data, o exame físico da gestante, de 33 semanas e permaneceu em seguimento com a obstetrícia, sendo avaliada pela cardiologia. Esta indicou escolha do momento de parto a critério da obstetrícia e via de parto cesariana com laqueadura depois, devido ao risco cardiovascular da paciente. Além disso, indicou digitálico em caso de novo evento de taquiarritmia. Assim, a gestante recebeu alta médica no dia 23 de março 2020, com prescrição de carvedilol, 3,125 mg 12/12 h e AAS, 100 mg/dia, bem como manutenção da Penicilina G benzatina a cada 21 dias. Em 30 de março de 2020, a mulher, agora com 36 semanas e 5 dias de gestação, deu entrada no serviço de emergência cardiovascular da Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna (FHCGV), com quadro de febre, tosse produtiva e insuficiência respiratória aguda. O exame físico evidenciou taquipneia em ar ambiente, pressão arterial de 100 x 70 mmHg e ausculta pulmonar com murmúrio vesicular audível com roncos difusos. O laboratório admissional mostrou as seguintes taxas: hemoglobina, 12,3; hematócrito, 31,6%; leucócitos, 20.900, com segmentados, 87,9%; linfócitos, 5%, sem desvio à esquerda; plaquetas, 137.000; índice internacional normalizado (INR), 1; tempo de protrombina, 11,7 segundos; tempo de tromboplastina parcial ativada (TTPA), 35 segundos; gasometria arterial pósintubação orotraqueal com pH 7,26; pressão parcial de gás carbônico sanguíneo (PCO 2 ), 50 mmHg; pressão parcial de oxigênio sanguíneo (PO 2 ), 136 mmHg; bicarbonato sanguíneo (HOC3), 22 mEq/L; Excesso de base, -4; saturação de oxigênio sanguíneo (SatO 2 ), 98%; lactato, 1,2 mmol/l; creatinina, 0,7 g/dl; sódio, 135 mmol/l; potássio, 3,5; magnésio, 1,8; cálcio iônico, 1,13; bilirrubinas totais, 1,36; bilirrubina direta, 0,85; bilirrubina indireta, 0,51; transaminase glutâmico-oxalacética (TGO), 27; transaminase glutâmico-pirúvica (TGP), 20; reação em cadeia da polimerase (PCR), 5 (VR < 5). Tomografia de tórax da paciente, com porção do ápice com evidência de vidro fosco difuso, predomínio periférico e derrame pleural bilateral (Figura 1), além de 1/3 médio com evidência de vidro fosco difuso, também periférico e derrame pleural bilateral (Figura 2). Foi realizada intubação orotraqueal, colocada em pressão controlada, pressão expiratória final positiva (PEEP) 9, frequência respiratória de 20 irpm, volume corrente 300, fração inspirada de oxigênio (FiO) 30%, com uma relação PO 2 /FiO 2 de 388. Também se coletou swab nasofaríngeo e oral, e foi feito PCR para COVID-19 e H1N1. Posteriormente, a paciente foi encaminhada para cesariana e laqueadura de urgência. A cirurgia foi feita sob anestesia geral. Diante da escassez de dados sobre a infecção por COVID-19 em gestantes e, em especial, gestantes cardiopatas, torna-se imprescindível o estudo e o conhecimento de como essa doença se comporta nesse grupo de pacientes e quais as possíveis consequências tanto para a mãe como para o recém-nascido. Concepção e desenho da pesquisa: Holanda LS e Vieira Junior FM; Obtenção de dados: Holanda LS; Análise e interpretação dos dados: Vieira L, Campos MT; Redação do manuscrito: Holanda LS, Silva IAC; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Holanda VBT, Serfaty D, Vieira Junior FM. Declaro não haver conflito de interesses pertinentes. O presente estudo não teve fontes de financiamento externas. Não há vinculação deste estudo a programas de pósgraduação. Este artigo não contém estudos com humanos ou animais realizados por nenhum dos autores. Epidemiology and cause of severe acute respiratory syndrome (SARS) in Guangdong, People's Republic of China Update: severe respiratory illness associated with middle east respiratory syndrome Coronavirus (MERS-CoV) worldwide Impact of middle east respiratory syndrome Coronavirus (MERS-CoV) on pregnancy and perinatal outcome Middle east respiratory syndrome Coronavirus infection during pregnancy: a report of 5 cases from Saudi Arabia Coronavirus disease 2019 (COVID-19) and pregnancy: what obstetricians need to know Coronavirus in pregnancy and delivery: rapid review Referências Este é um artigo de acesso aberto distribuído sob os termos da licença de atribuição pelo Creative Commons Figura 2 -Tomografia de tórax da paciente, 1/3 médio com evidência de vidro fosco difuso