key: cord-0814100-4scr06qy authors: Almeida, André Luiz Cerqueira; Santo, Thyago Monteiro do Espírito; Mello, Maurício Silva Santana; Cedro, Alexandre Viana; Lopes, Nilson Lima; Ribeiro, Ana Paloma Martins Rocha; Mota, João Gustavo Cerqueira; Mendes, Rodrigo Serapião; Almeida, Paulo André Abreu; Ferreira, Murilo Araújo; Arruda, Diego Moreira; Santos, Adriana Aguiar Pepe; Rios, Vinícius Guedes; Dantas, Maria Rosa Nascimento; Silva, Viviane Almeida; da Silva, Marcos Gomes; Sampaio, Patrick Harrison Santana; Guimarães, André Raimundo; Santos, Edval Gomes title: Repercussões da Pandemia de COVID-19 na Prática Assistencial de um Hospital Terciário date: 2020-09-17 journal: Arq Bras Cardiol DOI: 10.36660/abc.20200436 sha: c151d8abb064dff125796f083811283d3221b00d doc_id: 814100 cord_uid: 4scr06qy FUNDAMENTO: Ainda não temos informações acerca do impacto da pandemia da COVID-19 sobre a atividade médica assistencial no Brasil. OBJETIVO: Descrever as repercussões da pandemia da COVID-19 na rotina de atendimentos em um hospital terciário, referência regional em cardiologia e oncologia. MÉTODOS: Estudo de corte transversal. Foi realizado levantamento dos atendimentos no período de 23/03/2020 (fechamento do comércio local) até 23/04/2020 (P20) e comparado com o mesmo período em 2019 (P19).Resultados: Detectamos redução no número de consultas cardiológicas, teste ergométrico, Holter, monitorização ambulatorial da pressão arterial, eletrocardiograma e ecocardiograma (90%, 84%, 94%, 92%, 94% e 81%, respectivamente). Em relação à cirurgia cardíaca e cateterismo cardíaco, houve redução de 48% e 60%, respectivamente. Aumento no número de angioplastia transluminal coronária (33%) e de implante de marca-passo definitivo (29%). Houve 97 internamentos na UTI em P19, contra 78 em P20, redução de 20%. Diminuição dos atendimentos no pronto-socorro cardiológico (45%) e nos internamentos na enfermaria de cardiologia (36%). Houve diminuição nas consultas oncológicas de 30%. Sessões de quimioterapia reduziram de 1.944 para 1.066 (45%). Sessões de radioterapia diminuíram 19%. CONCLUSÃO: A COVID-19 provocou redução considerável no número de consultas nos ambulatórios de cardiologia, oncologia e demais especialidades. Houve uma preocupante diminuição no número de cirurgias cardíacas e nas sessões de quimioterapia e radioterapia nas semanas iniciais da pandemia. A procura por atendimento no pronto-socorro cardiológico, assim como as internações na UTI e enfermaria cardiológicas, também reduziram, gerando preocupação acerca da evolução e prognóstico destes pacientes portadores de outras patologias, que não a COVID-19, nestes tempos de pandemia. (Arq Bras Cardiol. 2020; [online].ahead print, PP.0-0) Em dezembro de 2019, foram descritos os primeiros casos de indivíduos infectados pelo novo coronavírus (SARS-COV 2) em Wuhan, China, que rapidamente alastrou-se pelo país, levando a grande número de mortes e de hospitalizações. 1 Em curto período de tempo, a doença pelo coronavirus 2019 (COVID-19) ultrapassou os limites da China e alcançou outros países da Ásia, Europa e Américas. Até meados do ano 2020 cerca de 8,5 milhões de pessoas tinham testado positivo para o novo coronavirus em mais de 187 países e 200 territórios, sendo 960 mil testes positivos no Brasil. Na mesma época, registrava-se próximo de 450 mil mortes no mundo atribuídas à COVID-19 (47 mil no Brasil). 2 Durante a pandemia, alguns autores registraram mudanças na estrutura do sistema de saúde em países da Europa e nos EUA, com importante declínio no número de atendimentos e procedimentos médicos não associados à COVID-19, incluindo aqueles de alta complexidade. [5] [6] [7] [8] [9] [10] [11] [12] Estas mudanças podem gerar, como efeito colateral, atraso diagnóstico e/ou terapêutico e consequente aumento no risco de descompensação de doenças crônicas. Ainda não temos informações acerca do impacto desta pandemia, e subsequentes ações governamentais, sobre a atividade médica assistencial no Brasil. O objetivo deste trabalho foi descrever as repercussões da pandemia da COVID-19 sobre o número de consultas, exames, internações e procedimentos médicos realizados em um hospital terciário, referência regional em cardiologia e oncologia. Estudo de corte transversal realizado em um hospital terciário com 110 leitos de enfermaria e 12 leitos de UTI. Trata-se de uma unidade referência regional em cardiologia (cirurgia cardíaca, cateterismo, angioplastia, dispositivos eletrônicos implantáveis, ecocardiograma e pronto-socorro [PS] cardiológico) e oncologia (quimioterapia, radioterapia e cirurgias oncológicas), que presta atendimento a pacientes tanto do SUS quanto do sistema de saúde suplementar. Para analisarmos a repercussão da pandemia da COVID-19 sobre as práticas assistenciais do hospital, foi feito um levantamento do número de atendimentos nos vários setores da unidade no período de 23/03/2020 (data do fechamento do comércio local) até 23/04/2020 (P20) e comparamos com os atendimentos realizados no mesmo período do ano de 2019 (P19). Trata-se de uma amostra de conveniência, com a inclusão de todos os pacientes com dados disponíveis em registros eletrônicos nos períodos supracitados. Foram coletados dados acerca das práticas assistenciais e admissões nos seguintes setores do hospital: UTI (predominantemente cardiológica), cirurgia cardíaca, cirurgia não cardíaca, cateterismo cardíaco, angioplastia transluminal coronária (ATC), implante de marca-passo, consulta em cardiologia, ecocardiografia, monitorização ambulatorial da pressão arterial (MAPA), Holter, eletrocardiograma (ECG), teste ergométrico, PS cardiológico, internamento na unidade de cardiologia, laboratório de análises clínicas, consulta em oncologia, sessões de quimioterapia, sessões de radioterapia, ultrassonografia, tomografia computadorizada, endoscopia, colonoscopia e retossigmoidoscopia. Realizamos uma análise descritiva dos dados obtidos na amostra. As variáveis nominais ou categóricas foram descritas por seus valores absolutos. As diferenças de eventos observada entre os dois períodos investigados foram descritas pelas razões absolutas e relativas. A análise dos dados, assim como a construção dos gráficos, foi feita com o auxílio do Excel®, Microsoft 365®. Este A redução que observamos no número de consultas em oncologia (30%), sessões de quimioterapia (45%) e sessões de radioterapia (19%) é um capítulo à parte. Recente estudo, realizado na Inglaterra e Irlanda do Norte, observou que a maioria dos pacientes com câncer, ou suspeitos de terem câncer, não estavam acessando os serviços de saúde durante a pandemia da COVID-19. 17 Como consequência, estima-se que este surto da COVID-19 tem o potencial de aumentar a mortalidade em cerca 20%, nos próximos 12 meses, nos pacientes com diagnóstico recente de câncer, apenas na Inglaterra. 17 Além disso, pacientes com câncer têm um risco quase quatro vezes maior de apresentar complicações graves secundárias à COVID-19, comparados aos indivíduos sem câncer. 18 Portanto, a monitorização dos pacientes oncológicos deve ser redobrada, e não diminuída, durante o curso da pandemia. O desafio de identificar e tratar complicações associadas a alguns quimioterápicos, como miocardite e/ou pneumonite severas, é outra questão a ser enfrentada pelos especialistas em tempos de pandemia da COVID- 19. 19 Os nossos resultados são de grande auxílio para os pacientes, os profissionais de saúde e os gestores hospitalares. Eles trazem à tona um problema grave, que está cursando em paralelo à pandemia da COVID-19: a redução considerável no número de consultas, cirurgias cardíacas e oncológicas, atendimentos em PS cardiológico, cateterismo cardíaco, sessões de quimioterapia e de radioterapia, exames laboratoriais, entre outros procedimentos médicos importantes e necessários para aqueles que não estão com a COVID-19. Uma redução no acesso aos cuidados médicos é associada a um declínio no estado de saúde da população. 20 O retardo no diagnóstico e tratamento do infarto do miocárdio ou do AVC aumenta o risco de morte. 21 A interrupção do uso de anti-hipertensivos, mesmo por curtos períodos, pode ocasionar graves complicações cardiovasculares. 22 A retirada das estatinas aumenta as taxas de eventos em pacientes com síndromes coronárias agudas. 22 A descompensação não diagnosticada do diabetes tem consequências graves. A demora na realização da cirurgia oncológica pode levar à progressão da doença e piora do prognóstico. O mesmo se aplica em relação às sessões de quimioterapia adjuvantes ou neoadjuvantes. O fato dos pacientes se absterem de ir ao hospital, não significa que as outras doenças desapareceram. Em absoluto! Elas continuam acometendo os pacientes, mas estes não estão procurando o atendimento médico na medida adequada. A questão é: por quê? Entre outros motivos porque, provavelmente, estão com medo de irem ao hospital devido ao risco de contraírem a COVID-19. É possível, ainda, que alguns pacientes com problemas cardiovasculares estejam procurando atendimento médico, mas os sintomas apresentados podem estar sendo confundidos com os da COVID-19. A recomendação expressa para as pessoas ficarem em casa, assim como a restrição na liberdade de trânsito e movimentação, também contribuem para o cenário que detectamos em nosso hospital. Não seria exagero dizer que estes indivíduos também se tornaram vítimas da COVID-19, mesmo sem terem sido acometidos da doença. Independente da causa, os resultados da nossa pesquisa são um espelho do que está acontecendo em vários outros locais. Tais fatos têm o potencial de gerar um efeito colateral preocupante: um substancial incremento na morbidade e na mortalidade, a curto e médio prazo, por causas outras que não a infecção causada pelo SARS-COV 2. 16 Esta seria a outra face da tragédia da COVID-19. É possível que, em breve, nos deparemos com uma curva ascendente, pós-pandemia, composta por pacientes com graves complicações secundárias a patologias que poderiam ter sido adequadamente tratadas, caso tivessem sido atendidas previamente e em um momento, teoricamente, mais favorável. Os nossos resultados abrem perspectivas para que outros pesquisadores investiguem qual o real desfecho destes pacientes que não estão comparecendo às consultas médicas eletivas, às sessões de quimioterapia e radioterapia, ao PS de cardiologia, assim como aqueles que não estão realizando os exames de rotina e/o as cirurgias oncológicas ou cardíacas no período da pandemia da COVID-19. Isto complementaria os nossos achados e traria importantes informações para a comunidade médica e para os próprios pacientes. Nosso trabalho apresenta algumas limitações. Trata-se de um estudo unicêntrico e o período de observação foi relativamente curto. Não acompanhamos o desfecho dos pacientes que deixaram de comparecer às consultas e/ou procedimentos em nosso hospital. Observamos as repercussões da pandemia da COVID-19 na prática assistencial de um hospital terciário como um todo, mas não caracterizamos as patologias que levaram os pacientes ao hospital. A pandemia da COVID-19 provocou importante redução no número de consultas nos ambulatórios de cardiologia, oncologia e demais especialidades no nosso hospital. Notamos também uma diminuição considerável no número de cirurgias cardíacas e nas sessões de quimioterapia e de radioterapia nas semanas iniciais da pandemia. A procura por atendimento no PS cardiológico, assim como o número de internações na UTI e enfermaria cardiológicas, também reduziu, gerando preocupação acerca da evolução e prognóstico destes pacientes portadores de outras patologias, que não a COVID-19, nestes tempos de pandemia. Concepção e desenho da pesquisa: Almeida ALC, Santo TME, Santos Jr. EG; Obtenção de dados: Almeida ALC, Santo TME, Mello MSS, Cedro AV, Lopes NL, Ribeiro APMR, Mota JGC, Mendes RS, Ferreira MA, Arruda DM, Santos AAP, Rios VG, Dantas MRN, Silva VA, Silva MG, Sampaio PHS, Guimarães AR, Santos Jr. EG; Análise e interpretação dos dados: Almeida ALC, Santos Jr. EG; Análise estatística: Almeida ALC; Redação do manuscrito: Almeida ALC, Almeida PAA, Santos Jr. EG; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Almeida ALC, Santo TME, Mello MSS, Cedro AV, Sampaio PHS, Guimarães AR, Santos Jr. EG. Declaro não haver conflito de interesses pertinentes. O presente estudo não teve fontes de financiamento externas. Não há vinculação deste estudo a programas de pósgraduação. A Novel Coronavirus from Patients with Pneumonia in China Boletim Epidemiológico Especial 07 -COE Coronavírus -06 de abril de 2020 Boletim Epidemiológico Especial 08 -COE Coronavírus -09 de abril de 2020 The COVID-19 outbreak and its impact on hospitals in Italy: the model of cardiac surgery Impact of Coronavirus Disease 2019 (COVID-19) Outbreak on ST-Segment-Elevation Myocardial Infarction Care in Hong Kong The impact of the COVID-19 outbreak on Liver Transplantation programmes in Northern Italy Impacto de la pandemia de COVID-19 sobre la actividad asistencial en cardiología intervencionista en España Reduction in ST-Segment Elevation Cardiac Catheterization Laboratory Activations in the United States during COVID-19 Pandemic The Swiss approach to the COVID-19 outbreak Decline of acute coronary syndrome admissions in Austria since the outbreak of COVID-19: the pandemic response causes cardiac collateral damage Outof-Hospital Cardiac Arrest during the Covid-19 Outbreak in Italy Comparison of cardiovascular mortality in the Great East Japan and the Great Hanshin-Awaji Earthquakes-a large-scale data analysis of death certificates Influence of the great East Japan earthquake and tsunami 2011 on occurrence of cerebrovascular diseases in Iwate Cardiac Arrest Deaths at Home in New York City Have Increased By a Startling 800% Cardiovascular Disease in the Post-COVID-19 Era -the Impending Tsunami? Heart, Lung and Circulation Estimating excess mortality in people with cancer and multimorbidity in the COVID-19 emergency Cancer patients in SARS-CoV-2 infection: a nationwide analysis in China Treatment-Related Adverse Events of PD-1 and PD-L1 Inhibitors in Clinical Trials: A Systematic Review and Meta-analysis A public hospital closes. Impact on patients' access to care and health status Association between physician follow-up and outcomes of care after chest pain assessment in high-risk patients Safety of Temporary Discontinuation of Antihypertensive Medication in Patients With Difficult-to-Control Hypertension Withdrawal of statins increases event rates in patients with acute coronary syndromes